Maria Clara M. Hagen
Quando
se fala do assunto literatura no contexto da Mesopotâmia durante a Antiguidade,
é possível formular o seguinte questionamento: existiria, realmente, algo que
pudesse ser descrito como “literatura” nesta época e local? Ao se deparar com a
tradução de textos milenares, como a Epopeia de Gilgamesh, o leitor moderno
pode encontrar elementos aos quais não está acostumado. As múltiplas lacunas e
os termos antigos de tradução desconhecida dificultam a leitura. A falta de
métrica reconhecível e descrições simples, banais à primeira vista, afastam os
poemas de tradições como a helênica, mais familiar.
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Muito interessante sua proposta de trabalho, bem como as considerações apresentadas.
ResponderExcluirMeu primeiro questionamento é o seguinte: considerando que na Mesopotâmia o comércio era uma atividade importante, pode-se dizer que o comércio tenha sido um fator que contribuiu para a difusão da leitura e da escrita no Oriente Próximo?
Outra questão: em seus estudos encontrou similaridades das obras literárias mesopotâmicas nas obras “ocidentais” (greco-romanas e hebraicas)?
Agradeço a atenção.
Atenciosamente Sandiara Daíse Rosanelli
Olá Sandiara, muito obrigada pelo interesse!
ExcluirSim, acredito que o comércio tenha sido um elemento importante para a difusão da leitura e escrita. O uso econômico da escrita é atestado desde seus estágios mais primitivos, e havia uma grande circulação de comerciantes no Antigo Oriente Próximo. Ademais, as transações eram comumente anotadas, com testemunhas e selos para garantir sua autenticidade. É muito rica a quantidade de informações econômicas que se consegue ter a partir destes textos.
Sobre a similaridade com outras tradições, já foram encontradas diversas semelhanças. Elementos sumérios e acádios na Bíblia e outras obras são atestados, entre eles um dos mais notáveis sendo a narrativa do Dilúvio. Quanto à tradição helenística, este tema também foi estudado, em especial quanto aos épicos. Sobre isso, há o livro de Martin L. West, "The East Face of Helicon", que possui análises detalhadas de diversos poemas mesopotâmicos e gregos, notando várias de suas semelhanças.
Att.
Maria Clara M. Hagen
Parabéns pelo texto, Maria Clara!
ResponderExcluirMinha pergunta volta-se à colocação do último parágrafo, em que utiliza a colocação de Black para atentar que a leitura por prazer provavelmente não era praticada na sociedade mesopotâmica. Ao longo do texto, no entanto, é mencionado que a literatura do período tinha outras funções além da preservação e da administração, e que muitas características que hoje atribuímos aos gêneros literários já eram consideradas naquela época. Assim sendo, relevando as recentes descobertas sobre a temática em questão, seria possível considerar que pelo menos entre os escribas - e talvez entre aqueles que também compartilhavam do privilégio do letramento - poderia se pensar num caráter mais "lúdico" desse ofício?
Atenciosamente,
Marcus da Silva Dorneles
Muito obrigada, Marcus!
ExcluirA maioria das pessoas só teria contato com estes textos literários a partir da performance, pois eles eram cantados em diversos contextos, como rituais. Isto pode ser atestado por marcas como "KI.MIN" ou "refrão". Poemas como os de amor ou satíricos poderiam ser cantados na corte para fins de entretenimento. Porém, realmente, havia obras que se imagina serem lidas apenas pelos próprios escribas, além das educativas. Um exemplo é o texto "Naram-Sin e as Hordas Inimigas", uma obra que narra um episódio atipicamente negativo deste rei e de Enmerkar, surpreendente pois na literatura são ambos muito respeitados. Imagina-se então que isto não seria lido para reis ou para a corte, e que provavelmente este texto só circularia em sua forma original entre os escribas!
Att
Maria Clara M. Hagen
Boa noite!
ResponderExcluirOnde podemos encontrar resquícios
dos escritos encontrados na antiga mesopotâmica?
Olá!
ExcluirInfelizmente, são poucos os textos mesopotâmicos traduzidos para o português. Obras antigas em geral são publicadas sozinhas ou em coletâneas, seja na forma cuneiforme para estudo ou traduzidas, em geral para o inglês, alemão ou francês. Muitos destes recursos podem ser encontrados também na Internet. A página CDLI (https://cdli.ucla.edu/) é um recurso bastante detalhado, com fotos dos tabletes cuneiformes e algumas traduções. Outros sites interessantes são o Archibab (http://www.archibab.fr/) e o ETCSL (http://etcsl.orinst.ox.ac.uk/) para obras sumérias.
Espero que isto seja de alguma ajuda,
Maria Clara M. Hagen
oi
ResponderExcluirBoa noite, muito bom seu texto. Ao fazer a leitura percebe-se como os povos antigos mesmo sem recursos eram perfeccionistas em seus registros. Atualmente percebe-se que não se dá tanto valor a escrita, a leitura, tudo está sendo substituído pelas facilidades da tecnologia, porém de uma maneira muita supérflua. Como a história da literatura antiga pode nos ajudar a valorizar mais esse grande invento do passado e que hoje é pouco valorizado ( a escrita).
ExcluirInês Valéria Antoczecen.
Parabéns pelo texto! Você escreveu que as mulheres não eram proibidas de aprender a escrita, acha que isso pode ter influência do fato ~da deusa da escrita ser uma figura feminina ou se tratava de uma sociedade onde as mulheres tinham mais liberdade?
ResponderExcluirAtt,
Ana Paula Sanvido Lara
Olá Ana Paula, obrigada pelo comentário!
ExcluirA sociedade antiga mesopotâmica, apesar de patriarcal, dava mais espaço às mulheres do que outras conhecidas da Antiguidade. Registros econômicos e administrativos mostram como as mulheres da Assíria e Babilônia tinham propriedades, administravam bens e exerciam funções importantes. Certas classes de sacerdotisas, por exemplo, eram bastante ricas. Em registros dos palácios atesta-se diversas profissões exercidas por mulheres, desde as de menor pagamento, como carregadoras de água, até escribas e administradoras. Na ala feminina destes palácios, a administração era especialmente conduzida por mulheres.
Assim, apesar de não ser uma sociedade igualitária, a presença de mulheres letradas é um dos indicadores que as mulheres podiam exercer papéis importantes além da esfera doméstica e familiar.
Att
Maria Clara M. Hagen
Excelente texto, parabéns!
ResponderExcluirA temática abordada é bastante pertinente, dito isso: Há possibilidade de se fazer uma analogia didática da literatura mesopotâmica com a literatura ocidental, em espaço escolar?
Att.,
Maykon Albuquerque Lacerda
Olá Maykon, muito obrigada!
ExcluirAcredito que sim, porém, pela falta de traduções em português de vários textos importantes, provavelmente o material referente a isto terá que ser produzido pelo próprio professor. O artigo da profª. Drª. Katia Pozzer que referencio no texto seria um bom ponto de partida, pois traz muita informação sobre o desenvolvimento da escrita.
Acredito que a Epopeia de Gilgamesh poderia ser uma obra interessante, tratando-se de um poema épico e por contar também a história do dilúvio, que muitos alunos irão reconhecer. Além disso, ela foi traduzida para o português recentemente por Jacyntho Lins Brandão.
Att.,
Maria Clara M. Hagen
Parabéns pelo texto, Maria Clara!
ResponderExcluirO texto é bem reflexivo e extremamente pertinente. Em sua opinião, pode haver um dialogo sobre o feminismo a partir de seu recorte espacial?
Olá Ananda, muito obrigada.
ExcluirSim, acredito que há um grande potencial para estudos sobre gênero e mulheres na área da literatura mesopotâmica! Recentemente foi publicado um livro sobre as autoras da antiga Mesopotâmia, "Women's Writing of Ancient Mesopotamia", de Saana Svard. Nele há a tradução de um provérbio babilônico: "Minha boca me torna igual a um homem". Ele está escrito em Emesal, um dialeto do Sumério que é tradicionalmente associado às mulheres. Este apenas é um exemplo de temas que podem ser abordados.
Sobre as mulheres na Babilônia, posso citar o livro "Women of Babylon", da autora Zainab Bahran.
Att,
Maria Clara M. Hagen
Boa noite, muito bom seu texto. Ao fazer a leitura percebe-se como os povos antigos mesmo sem recursos eram perfeccionistas em seus registros. Atualmente percebe-se que não se dá tanto valor a escrita, a leitura, tudo está sendo substituído pelas facilidades da tecnologia, porém de uma maneira muita supérflua. Como a história da literatura antiga pode nos ajudar a valorizar mais esse grande invento do passado e que hoje é pouco valorizado ( a escrita).
ResponderExcluirInês Valéria Antoczecen.
Olá Inês,
ExcluirMuito obrigada pelos elogios, fico feliz que tenha gostado do texto!
A escrita realmente é um grande presente que herdamos dos sumérios.
Att
Maria Clara M. Hagen