Isabella dos Santos Daiub

 

AS INICIATIVAS E AS REFLEXÕES SOBRE GÊNERO NO DESENVOLVIMENTO DA LUTA PELA CONCRETIZAÇÃO DE ROJAVA


O meu interesse no momento é de propor em refletir sobre o domínio da linguagem masculina, do conhecimento e do que é entendido como progresso do saber, percebendo como a dominação dos discursos hegemônicos subjugam os indivíduos às hierarquias de gênero que geram violências que transcendem a história, fronteiras e os continentes. Vou apresentar a jineolojî, o contexto histórico e da experiência das mulheres do curdistão, ambiente em que construiu a ciência da mulher. Mas para um verdadeiro entendimento sobre as perspectivas da experiência dessas mulheres é necessário tomar que em toda sociedade construída pela disputa de poder a estrutura patriarcal permitirá a penetração e a imposição das normas sociais delimitadoras do humano. Admitindo a força dessa subjugação sobre os corpos femininos também é necessário para uma melhor compreensão das camadas da estrutura opressora buscar identificar os outros mecanismos de controle do poder para além da questão de gênero, onde entre elas a mulher oriental transporta consigo a generalização e os reducionismos das representações do imaginário orientalista baseado na unidade, tendo a sua individualidade esvaziada para a manutenção do discurso do poder hegemônico responsável pela construção da narrativa histórica.

Os estudos pós-coloniais evidenciam as formas que o Ocidente legitima a própria construção de civilização como superior à de um outro, como criou e designou o que é a cultura Oriental, descrita com um leque de características criadas pelo conhecimento orientalista, definindo como um lugar e uma cultura distante, por vezes sensual, ou exótica, atrasada e, cada vez mais vista como uma constante ameaça à ordem civilizatória e ao progresso da sociedade.

Essa perspectiva orientalista recai sobre a representação da mulher oriental, onde o reducionismo e a generalização das práticas sociais, culturais e religiosas anulam a realidade perante a representação criada. Mesmo entre as discussões de gênero a sombra dessa interpretação feita pelas relações de poder e pelo orientalismo está presente contribuindo para a manutenção da hegemonia ocidental e para a construção de categorias. Entre as escritoras que percebem essa influência do orientalismo, Leila Ahmed professora e pesquisadora egípcia expõe um “feminismo colonial” legitimando as práticas políticas em relação ao Oriente Médio e Lila Abu-Lughod questiona o papel da antropologia nas disputas de poder, propõe discutir sobre o “feminismo transnacional” para aceitar a possibilidade da diferença, dispensando as categorias de representação impostas e recusando o relativismo cultural. (CHAISE, 2016)

Analisando as experiências históricas ocultadas das mulheres ao redor do mundo, é possível contestar o imaginário imposto a cada uma delas. Nos últimos anos a repercussão internacional da atividade do exército de mulheres do curdistão, o YPJ (Unidade de Proteção das Mulheres) expôs uma dessas experiências de feminismo, onde se desenvolve junto às discussões sobre a solução para a questão curda, que tem origens históricas após a primeira guerra mundial nas discussões sobre a partilha do Império Otomano, que assim como outros processos de divisão de territórios na história desconsiderou as configurações locais.

E para compreender as raízes do movimento revolucionário das mulheres curdas é necessário, como Abu-Lughod argumenta, atenção ao que se discute entre as autoras feministas para evitar mais uma conquista das hegemonias dominantes. Partindo desses cuidados e da consciência do jogo de disputas de poder no cenário geopolítico e histórico, a resistência curda tem traçado estratégias efetivas desde a criação do PKK (Partido dos Trabalhadores do Curdistão). Relembrando e celebrando a figura de Sakine Cansiz, encontramos em sua participação como co-fundadora do PKK (Partido dos Trabalhadores do Curdistão) a agitação para discussões sobre a necessidade de um movimento autônomo de mulheres e sobre a libertação da mulher desde a criação do partido em 1978. O partido se forma defendendo a criação de um Estado curdo e sofre a intensa perseguição do governo turco que perdura há décadas. No contexto das circulações de ideias pós-guerra fria o PKK (Partido dos Trabalhadores do Curdistão) distancia-se do marxismo clássico com as perspectivas de classe e da defesa pela criação de um Estado curdo, por meio de reflexões internas que concluíram que a existência de um o sistema opressivo é intrínseca ao Estado que serve ao poder dominante.

Ao se afastar da ideia da criação de um Estado, o movimento curdo ao mesmo tempo que resiste aos ataques do exército da Turquia – e de outros agentes políticos ao longo dessas décadas de resistência, também garante grandes avanços na esfera intelectual ao dar a educação política e social um importante lugar dentro da revolução. O fundador do partido e líder curdo Abdullah Öcalan, preso desde 1999 possui uma grande produção textual e encontrou uma possível solução para a questão curda elaborando o confederalismo democrático, alternativa ao sistema capitalista cujos os princípios sustentam-se na libertação humana no que se refere às relações com a natureza, contra a degradação ambiental e na luta contra todas as formas de escravização, considerando a mulher o primeiro ser colonizado e por isso, a emancipação da mulher, assim como a superação das normas de masculinidade são as condições para a revolução social e para o autogoverno se tornar possível.(ÖCALAN, 2016)

Mas não partem apenas de Ocalan as reflexões acerca da questão da libertação da mulher, na história do movimento curdo e nos anos da criação do PKK (Partido dos Trabalhadores do Curdistão) a presença de vozes femininas é afirmada por elas próprias - como na biografia de Sakine Canzis publicada em 2018, “Sara: my whole life was a struggle” e o entendimento de que uma organização autônoma de mulheres era coerente crescia. Pode-se pensar em duas experiências encontradas em relatos dos anos em que os combates armados foram intensificados e as estratégias da revolução tiveram de ser reformuladas.  Primeiro considerando as experiências das guerrilhas mistas e o descrédito dado a figura feminina em combate, é exposto durante as pautas do partido o ambiente hostil em que as guerrilheiras eram colocadas e em 1993, a primeira guerrilha de mulheres é formada. Durante os anos de intensa perseguição saem das prisões os depoimentos, sobretudo e os de mulheres que contam a consolidação dos laços de resistência que caracterizam a potência dessa alternativa encontrada no movimento de Rojava (COMITÉ DE JINEOLOJÎ EM EUROPA, 2020).

Reforçado por essas duas experiências de organização o debate sobre a emancipação mental, espiritual e econômica da mulher despertou na revolução e essas reflexões encaminhadas especialmente na década de 1990 foram concretizadas na revolução pelo Confederalismo Democrático. Durante o encarceramento, em suas publicações expõe a necessidade de superação do “macho dominante”, o que internaliza no indivíduo as normas de ordem social impossibilitando a vontade pelo bem-estar da sociedade livre.

Discute-se nessa linha de raciocínio a “teoria da separação” quando se descobre as dimensões das limitações que a influência do “macho dominante” impõe seja ao homem, a mulher ou a criança, nesse sentido a superação das mentalidades autoritárias é essencial para a mudança nos modos de viver almejada e a educação voltada para essa necessidade passa a exercer um papel prioritário para a revolução. Para preservar o campo das ideias e consolidar a “sociedade saudável” é incentivada a responsabilidade pela comunidade com a defesa da liberdade individual e de existência.

Com a intensificação dos combates e a prevalência do exército turco, a posição do Partido dos Trabalhadores do Curdistão é de rever suas estratégias e a pensar em mecanismos de defesa, com o golpe de 1980 na Turquia começa a época dos exílios, depois o recuo do combate e o partido se estabelece no território Sírio sob os embargos do governo Assad. É fundamental destacar que o século XX no Oriente Médio com o crescente nacionalismo foi profundamente marcado pelos processos de assimilação forçada e arabização em uma intenção de dissolver a variedade cultural e os costumes das minorias étnicas em favorecimento de grupos, não necessariamente majoritários apoiadores do governo – assim como na atualidade, potências globais e locais estavam envolvidas estrategicamente nos assuntos relacionados a ocupação do território.

Todo esse contexto incentiva os envolvidos com o Confederalismo Democrático e com a resistência da luta curda a buscar formas de viabilizar a proposta do modo de vida alternativo ao sistema patriarcal capitalista e nessa intenção a educação ideológica passa e ser parte crucial na formação nas guerrilhas e nos vilarejos - e nesse ponto acho conveniente explicar um pouco de como se dá o municipalismo implantado. Em 2012 durante o Congresso Nacional foi declarada oficialmente a autonomia de Rojava ao norte da Síria – não confundir com o Curdistão iraquiano que possui seu próprio governo e diferenças com os curdos revolucionários. A região é dividida em três cantões, Jazira, Kobanî e Afrin onde uma democracia radical é buscada por meio dos Conselhos Locais – a exemplo do Conselho do Curdistão, dos Conselhos de Cidade, Conselhos de Vila, de acordo com a necessidade e quantidade de habitantes de cada região. Os conselhos também têm como uma das prioridades garantir uma justa representação étnica, religiosa e de gênero em cada nível da estrutura democrática e podem designar Comitês para executar o que fora decidido em assembleia baseado no consenso, havendo a cada grupo/comunidade decidir deliberar ou não às conclusões discutidas nas assembleias.

Durante os anos 2000 é percebido o estabelecimento das redes transnacionais, outro mecanismo de defesa eficaz, e a pulverização da propaganda da autoadministração. Todas as ideias formuladas pelas pessoas participantes da revolução ultrapassaram fronteiras e são discutidas globalmente em centros de pesquisa e nos Comitês Internacionalistas. Os debates teóricos deram forma a jineolojî, a ciência da mulher/vida, que foi pensada para ser uma alternativa ao sistema de conhecimento da ciência positivista buscando explorar as experiências ocultadas na história, remetendo muitas vezes aos conhecimentos ancestrais e a tradição oral e envolvendo diferentes saberes desde a medicina, sociologia, antropologia à mitologia contestando a autoridade intelectual moderna.(TÊKOSÎN,2017) Com esse propósito Comitês, locais e internacionais são designados a fim de garantir meios de capacitação técnica e intelectual aos vilarejos auto administrados junto a busca pela superação das sequelas causadas pela guerra.

Pesquisadoras em diferentes centros escrevem sobre as potências da revolução. O municipalismo libertário, o confederalismo democrático, a história e memória das minorias étnicas e a jineolojî também é desenvolvida na Universidade de Rojava, como na Europa e na América Latina, não é difícil encontrar os canais de comunicação de cada Comitê com textos e publicações sobre a guerra e revolução, apesar do acesso para a América Latina, especialmente para o português ainda deixar um pouco a desejar, se considerar a velocidade da circulação de fontes nos últimos anos. No Brasil a internacionalista Maria Florencia Guarche Ribeiro desenvolveu a sua pesquisa para compreender as perspectivas epistemológicas colocadas em questão pelas mulheres de Rojava abrindo um caminho para outras pesquisadoras explorarem o tema, assim como os esforços de coletivos, grupos de estudos e comitês para traduzir os textos, notícias, publicações sobre a revolução são compensados pelo sucesso dessa rede de compartilhamento. Maria Florencia, com as devidas ressalvas e noção das diferenças, percebe como podemos alocar a questão do “lugar social” e do “privilégio epistêmico” abordado por escritoras negras norte-americanas, no caso Bell Hooks e Patricia Hill Collins para fundamentar a crítica a produção de saber feitas pelas mulheres curdas,

Assim como Bell Hooks e Patricia Hill Collins, que destacam a importância de uma   práxis crítica centrada na experiência das mulheres, propomos pensar a Jineologî, enquanto proposta de ruptura epistêmica, em diálogo com as construções teórico-metodológicas das autoras negras. Reconhecemos que se tratam de contextos políticos e sociais radicalmente diferentes e que as autoras negras centram seus esforços em comprovar a matriz de dominação (Collins 2019) racista que informa as hierarquias sociais no contexto norte-americano, algo que não ocorre no Curdistão. Ainda que as políticas repressivas no Curdistão tenham como parâmetro os marcadores sociais de caráter étnico, é importante estarmos atentas as especificidades de cada contexto. Ainda assim, acreditamos que a valorização das experiências apresentadas pela teoria do ponto de vista e o reconhecimento da potência criativa das margens presentes nessas abordagens favorecem a compreensão das narrativas e resistências advindas desde o Curdistão. Dessa forma, para que compreender o lugar ocupado pelas mulheres dentro do Movimento de Libertação Nacional torna-se relevante considerar sua trajetória de organização” (RIBEIRO, 2019).

A importância da tradução e da difusão do conhecimento é outra característica da revolução que cada vez mais demonstra o seu caráter transfronteiriço, é por esse sentido que se dá a busca pelas alternativas para a superação da linguagem masculina, incentivadas por mulheres que valorizaram o ato de escrever e traduzir uma geração de pesquisadoras feministas estão compreendendo a variedade das perspectivas sociais buscando fazer circular o saber anulado na disputa das narrativas pelo discurso hegemônico para tornar possível um conhecimento horizontal.

Atualmente o projeto de Rojava demonstra-se a cada passo que é possível pensar em uma revolução social e uma alternativa sistêmica. Na última década além do exército da Turquia e dos embargos do governo Sírio, os curdos e as minorias étnicas que também sofreram com o processo de assimilação cultural forçada foram ameaçadas pelo Daesh e os exércitos dos combatentes curdos foram capazes de libertar regiões que antes estavam sob o domínio dos grupos fundamentalistas, a retirada do apoio norte-americano no final de 2019 também não abalou definitivamente com a defesa da região.

O fator do embargo econômico e de infraestrutura histórico, assim como o uso dessa estratégia das potências globais e locais nos territórios não só no Oriente Médio para impedir qualquer forma de autonomia ou viabilidade de crescimento merece atenção para compreender a agressividade dos agentes capitalistas em todos caminhos da existência humana. A segunda edição publicada no Brasil em 2017 com artigos de autoria de diversas pessoas e/ou grupos o quinto capítulo do livro “A Revolução Ignorada: Liberação da mulher, democracia direta e pluralismo radical no Oriente Médio” traz em um dos capítulos a relação dos curdos com o governo Assad da Síria mostrando as ações recorridas para manter o empobrecimento das minorias vulneráveis,

“Além desses confiscos de terra, o regime impôs uma série de leis, a última delas aprovada em 2008, que fazia com que a vida dos curdos na região fosse péssima, obrigando-os a imigrar para as cidades ou outras regiões. Foi determinado basicamente que Rojava só poderia produzir trigo e petróleo, e que estaria impedida de desenvolver qualquer outra atividade. Isso foi levado adiante proibindo-se a implantação de indústrias ou de qualquer atividade econômica que não fosse a agricultura de trigo.

Rojava se converteu no celeiro da Síria, produzindo 70% das necessidades de trigo do país. Apesar disso, o governo não permitiu que nenhum moinho fosse construído para moer o trigo ou processá-lo. Isto é, era feito o impossível para manter a atividade econômica tão somente no âmbito da agricultura, devendo as demais etapas do processo serem concluídas em outras partes do país. Além do trigo, em Rojava também se extraía petróleo, já que é onde se concentra as principais reservas do país, mas novamente as refinarias se situam fora do território curdo. Inclusive chegou-se a promulgar uma lei que proibia a construção de qualquer edifício de grandes dimensões. O resultado de tudo isso é que antes da revolução não havia nenhum tipo de infraestrutura industrial” (EDITORA DESCONTROL, 2017)

Passado o horror quando um exército curdo recupera alguma região, é garantido às pessoas libertadas meios de superação dos traumas e a acolhimento em um ambiente onde os valores hierárquicos não são mais o ponto em que a sociedade se baseia, nos vilarejos espalhados pelos cantões a assistência e infraestrutura é garantida pelo Conselho do Curdistão a qualquer indivíduo independente de sua origem familiar ou religiosa. O atravessamento de fronteiras que a luta de Rojava, o sucesso do municipalismo, a autossuficiência dos vilarejos e cidades, a construção coletiva de significados, a resistência mesmo sob os ataques imperialistas e às falsas acusações – seja de terrorismo ou de traição a luta anti-imperialistas, todos esses fatores e outros demonstram a potência dessa revolução e desse movimento de luta histórico onde o modo de vida capitalista não é a única orientação.

Todos os canais de comunicação dos Comitês e das organizações possuem um vasto material de informações e de produção textual. Artigos, ensaios, entrevistas, publicações sobre os congressos sobre a jineolojî podem ser encontrados no website, https://jineoloji.org/, todos livros publicados por Ocalan em http://freeocalan.org/ e em outras plataformas também possuem textos acessíveis. Em congressos acadêmicos a jineolojî é feita a crítica a mentalidade colonizadora, é esse espaço teórico que pode possibilitar questionamentos em dimensões variadas, para citar um exemplo, a presença constante da “mulher” como uma categoria, possibilitando uma exclusão é confrontada nesses campos de pesquisa sem ignorar as implicações locais Quando penso sobre essas conexões possibilitadas pela jineolojî também me recordo quando Bell Hooks propõe pensar a teoria cura e como prática libertadora incentivando as referências à mulheres e às histórias marginalizadas (HOOKS, 2013).

Tudo – ou pelo menos o que é de interesse em contar, sobre a revolução está sendo devidamente documentado e divulgado, as escolas, centros de saúde, o projeto ecológico, o desenvolvimento sustentável e o funcionamento do autogoverno. De Rojava pelos meios de comunicação impulsionados de dentro da revolução as vozes das pessoas envolvidas pela “sociedade saudável” ecoam globalmente espalhando a sua própria versão de sua história. Penso também que diante a uma crise sanitária global e de degradação ambiental a revolução de Rojava parece estar cada vez mais demonstrando o seu potencial prático e a solução curda pode não parecer mais mera utopia. As provas de eficiência do modelo curdo incomodam aos agentes imperialistas e as tentativas de aniquilação vão se tornar mais agressivas também no que se refere a disputa de poder pelo discurso, porém o potencial da resistência deve ser preservado junto a tudo que foi construído e posto em prática ao longo de mais de cinco décadas. Entre outras razões é também pela busca pela autossuficiência de sua narrativa e saber que proponho uma atenção a esse movimento curdo, a suas origens, o seu desenvolvimento que como busquei expor, é repleto de fontes e perspectivas, especialmente no que nos sugere sobre a liberdade da humanidade e a autossuficiência das comunidades, que possam nos encaminhar para espaços e circunstâncias para uma mudança social.

 

Referências

Isabella Daiub é Mestranda do Programa de Pós-Graduação em História Social PPGHIS/UFRJ


CHAICE, Mariana Falcão. Feminismo Transnacional: uma lente para o Anti-Orientalismo. Florianópolis: Estudos Feministas, 2016.
Jineolojî, Azadê Plataforma de Solidaritat amb el Poble Kurd (canal no youtube), S/L. COMITÉ DE JINEOLOJÎ EM EUROPA: 2020. 1 vídeo (1h04m54s)
EDITORA DESCONTROL, “Breve História de Rojava” em “A Revolução Ignorada: feminismo, democracia direta e pluralismo radical no Oriente Médio”, Vários Autores. São Paulo: Autonomia Libertária, 2017.
HOOKS, Bell. Ensinando a Transgredir - A Educação Como Prática da Liberdade. São Paulo, Martins Fontes, 2013
ÖCALAN, Abdullah. Confederalismo Democratico. S/L: International Initiative Edition, 2013.
_________. Libertando a vida: revolução das mulheres. São Paulo: Fundação Lauro Campos, 2016.
RIBEIRO, Maria Florencia Guarche. A Jineologî como uma contribuição à epistemologia feminista: um debate desde a perspectiva das mulheres curdas. Peru: XXXII Congresso Internacional Alas, 2019.
SAID, Edward. Orientalismo: O Oriente como invenção do Ocidente. São Paulo: Companhia das Letras, 2007
TÊKOSÎN, Avjîn. Reflexiones sobre el hombre y la masculinidad en el patriarcado, [S/L]: jineolojî.org, 2017 [disponível em http://jineoloji.org/es/reflexiones-sobre-el-hombre-y-la-masculinidad-en-el-patriarcado/#sdfootnote22sym acesso em 04/09/2020]

10 comentários:

  1. Olá. Gostei muito de seu artigo, não conhecia sobre Rojava e muito menos a organização da sociedade. Sobre o papel da mulher: como ocorre agora com Rojava? Quais as mudanças efetivas com a participação feminina na sociedade? Como os homens dessa sociedade se transformaram? E as mulheres conseguiram sair do ambiente privado totalmente- para o público?

    Seu texto é muito bom. Obrigada
    Paola Rezende Schettert

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    2. Fico feliz que tenha gostado e obrigada pela pergunta que por ela eu posso mostrar o que optei por deixar de fora nesse texto, que é a prática da emancipação feminina.
      Como expliquei, a libertação da mulher, logo a superação da mentalidade dominante é entendida como primordial no projeto do Confederalismo Democrático, então no momento de colocá-lo em prática a reinvindicação pela participação da mulher está em ação. Então o municipalismo atualmente é baseado no sistema de co-presidencialismo, um homem e uma mulher(também há outros mecanismos para garantir a democracia radical considerando gênero, religião, origem local, etnia etc de acordo também com a realidade de cada vila/cidade/região) e necessariamente deve existir para cada comitê um comitê independente de mulheres para discutir as pautas referentes às mulheres. Assim é feito para garantir a emancipação da mulher em todos os campos, seja social, econômico, mental, cultural etc.
      Olhando a história desses partidos político curdos a crítica que é iniciada por Öcalan também está presente, com isso espaços para lideranças femininas são reivindicados e formas de efetivar essa demandas são discutida em congressos de mulheres(locais e internacionais com as mulheres exiladas, isso começaria na década de 1980). O atual Partido de Libertação das Mulheres(PJA) nasceu desse processo na década de 1990.
      O homem dessa revolução é cobrado de estar aberto para a superação da mentalidade dominantes também, por entender que ele apenas será livre quando todos forem, quando ele também estará livre das normas de sociabilidade. Nesse sentido a educação livre é pensada para possibilitar esse requisito para a revolução.
      Para responder a última parte da sua pergunta não poderei ser muito precisa pelo fator de se tratar de uma guerra contemporânea e por não podermos generalizar o que "aconteceu com as mulheres" mas posso usar o recorte espacial da minha pesquisa para mostrar uma perspectiva atual, a Jinwar que é uma vila de mulheres que começou a ser construída em 2017. Um dos objetivos dela é construir um ambiente que possa tornar a emancipação real, nesse espaço mulheres e crianças foram acolhidas visando a superação dos traumas sofridos durante a guerra(em 2017 o YPJ e o YPG estavam liberando os territórios ocupados pelo Daesh), pelos relatos encontramos mulheres de diversas religiões e "lados" da guerra que foram libertadas e recebidas nas aldeias, mas também encontramos mulheres que souberam na possibilidade da revolução e das vilas e resolveram sair da casa de suas famílias para se juntar a esses espaços.
      Por fim, uma indicação de um documentário que te responderá melhor https://www.youtube.com/watch?v=SMwFY3SoBUY&t=1s.

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  3. Parabéns pelo seu trabalho. Vai colaborar muito com as minhas pesquisas de gênero.
    Algumas partes do seu texto que me chamaram bastante atenção foram a questão da visão de que o sistema opressivo é intrínseco ao estado e que este serve ao poder dominante. Também a questão da educação política e social visando superar a mentalidade autoritária. Por fim me marcou a questão dos estudos que mostraram as ações para manter o empobrecimento das minorias vuneráveis e a questão da autossuficiência das comunidades.
    Ao fazer esses recortes no seu trabalho e interligá-los foi possível estabelecer relações com algumas questões do Brasil atualmente.
    Você acredita que seria possível trabalhar essas formas de resistência visando a educação política, social e econômica das meninas em sala de aula atualmente levando em conta o crescimento dos extremismos religiosos e do conservadorismo político no país?

    Ass: Daniela Jaques Roos

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    1. Obrigada, Daniela.
      Acho que seja possível sim, inclusive a jineolojî é incentivada como alternativa epistemológica para além da revolução no território autônomo e também temos outros exemplos globais, a educação dos zapatistas sempre é destaque quando pensamos em exemplos.
      Claro que esse crescimento é um obstáculo mas ele também comprova o quão necessário o trabalho de libertação mental, precisamos buscar espaços para esse tipo de questionamento, conheço projetos de colegas em suas igrejas que receberam apoio das mulheres mais velhas mesmo com a resistência das autoridades masculinas, por exemplo.
      Eu acredito que a educação realmente livre seja a melhor ferramenta apesar de não ser um caminho fácil e de resposta imediata, e isso também vejo que seja um problema já que o conservadorismo têm se fortificado com muita velocidade.

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    2. Olá Isabella.
      Concordo plenamente com você. É uma resistência contínua por um caminho complexo.
      Muito obrigada pela atenção.
      Atenciosamente Daniela Jaques Roos

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  4. Oi, Isabella! Parabéns pelo excelente texto. Já tratei de enviá-lo para amigos que participam de grupos militantes e desconhecem a luta revolucionária das mulheres curdas; creio que pode abrir caminhos ainda não explorados e ser de bom proveito.

    Algo que me chama a atenção é justamente isso, o desconhecimento ou a desatenção da questão curda, mesmo por parte de pessoas engajadas em movimentos de esquerda, restringindo a discussão a grupos pouco numerosos, geralmente libertários, que realizam um trabalho admirável para fazer avançar uma cultura política que considera e respeita a diversidade de saberes dos diferentes povos e suas reivindicações específicas. Gostaria de saber como isso se dá dentro do ambiente acadêmico, se existe um interesse expressivo por parte de pesquisadoras/es em abordar o tema, e se existe alguma resistência por parte das instituições.

    Outra vez, meus cumprimentos pela pesquisa. Certamente vem a somar aos esforços para levar adiante essa revolução que, na minha opinião, é um dos acontecimentos contemporâneos mais animadores (juntamente às Zapatistas), e deveria receber muito mais atenção! Saudações

    Pedro Marques Chavez Gil

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    1. Olá, boa noite! Obrigada, Pedro e ótima pergunta para encerrar!
      Essa desatenção a questão curda é muito parecida com a dos zapatistas, os movimentos “progressistas”/de esquerda atuais parecem querer anular as alternativas que fogem do dualismo político que as mentes parecem presas. Mas isso também é o medo dos questionamentos (parte chave do PKK e uma das coisas que chamou atenção para a escolha desse recorte para a minha pesquisa) É também bem assustador como muitos descrevem esse movimento curdo como “fantoche” das potências imperialista, ignorando a influência midiática (atualmente e no século passado, vou indicar ao final um documentário que pode elucidar essa parte para você) e o histórico da resistência.
      Sobre o ambiente acadêmico é bastante complicado, muito por esses mesmos motivos que você e eu apontamos. Apresentei o meu projeto de mestrado para duas bancas e a diferença da recepção foi gritante. Em uma delas eu senti que o tema e a perspectiva extremamente desprezados, fizeram perguntas na arguição que me quebraram, levantaram questões que não eram referentes ao meu projeto e demonstraram um grande preconceito ao tema como se eu tivesse decidido por ele por pura empolgação momentânea/moda. Na outra foi bem mais tranquila e eu consegui defender o meu projeto sem perguntas desconcertantes, mostrando que a banca havia lido o meu projeto (e por acaso o programa em questão tem uma diversidade de pesquisas muito maior do que o outro que eu tentei), mas a experiência da primeira arguição me marcou muito negativamente.
      Felizmente a cada ano temos mais projetos e pessoas interessadas na autoadministração do norte da síria e no confederalismo democrático, eu comecei a pesquisar sobre o tema durante graduação e posso dizer que a quantidade de material bom está bem mais diversa e já podemos reparar até em uma “coesão historiográfica” entre os pesquisadores, estamos cada vez mais nos encontrando entre os textos e conquistando espaços de reflexões.
      Muito obrigada,
      Isabella.

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    2. esqueci da indicação do documentário rs https://youtu.be/lg1kAwrqlcw

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